Mel Adún
Como chove em São Salvador City! Foi exatamente nessa época do ano que nos conhecemos. Na época única por essas bandas quando fazemos amor embaixo dos lençóis. Lembro de como dormíamos abraçados, enroscados no calor do outro. Tão dispostos a aceitar o nós. Tão singular no plural. O barulho da água que caía do céu ditava o nosso ritmo, arrítmico. Lembro que a sua perna sobre o meu culote não me incomodava; como era bom te sentir dentro de mim, dono de mim. Não possessivamente. Eu era sua porque de mais ninguém poderia ser, nem de mim mesma; assim como você era meu. O nosso quarto era a África tão perto quanto distante; éramos majestades em cima da cama. Às nossas descobertas, nossas bocas nunca deixavam de se encontrar.
O rei de azul e a rainha de amarelo sob o teto do castelo que era qualquer lugar que abrigasse a nossa vontade. Quanta vontade! Doce vontade. Às vezes suaves outras nem tanto. Entre aquelas tantas paredes ficou registrada a nossa passagem. Nenhuma temporada vai ser como aquela. Nenhuma gota de aprovação dos deuses cairão no mesmo lugar. Ninguém vai sentir o que sentimos.
Como é diferente ver a chuva cair agora sozinha. Como é estranho ser eu novamente.
Nessas noites de chuva sinto saudades de nós. Quando euteamos eram verdades e sentíamos até um frio na barriga...
quarta-feira, 5 de março de 2008
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2 comentários:
É um texto - como ele propõe pelo avesso - rítmico. As palavras se encontram, o sentido procura o seu lugar comum. Nele percebemos a destreza da pena da escritora. É como se estivessemos de fato numa cama, deitados, olhando para o céu azul marinho e o contraste da lua amarela. É como se beijos e braços fossem simplesmente maneiras únicas de amar. Apesar de breve, o texto esboça sutilezas e símbolos, que imbricados com a história da autora - como separá-los - ganham força.
texto meigo, bem marcado na africanidade da autora e com sutilezas de profunda essencia na mitologia africana. "era sua por não poder ser de mais ninguém" revella uma postura anti romantica da mulher moderna, que não se entrega ao "principe encantado" mas se INTEGRA a ele por vontade própria e consciente de seu afeto. Essa postura, porém, é traída no fim do conto, pela diificuldade da personagem se reencontrar com o seu próprio eu. Não vejo como erro na construção da personagem, mas como resultado de humanidade mais complexa e rica do ser mulher. Ser contraditóorio é ser real.
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