domingo, 12 de agosto de 2007

História que contei aos meus filhos

Ismael Teixeira

Ela viu um dia pousar no seu quarto; com pés descalços um pobre passarinho. Vinha de árvores, vinha de galhos, vinha em frangalhos dos tantos sonhos que iam. Amparou-lhe com mãos discretas, contou-lhe histórias, costurou roupinhas e sem querer de repente os dois se encontraram: olhares, encantos e poesias. Mágico como um conto de fadas amaram-se, e escondidos ali fizeram um ninho. O pássaro pequeno foi crescendo, crescendo depressa e pensava em casar ter dinheiro e família. A menina em plumas sonhava na janela em sumir à tardinha com cada revoada que ia. Caminhos cruzados, caminhos contrários, foram descalços escapulindo a cada dia. Até que numa primavera de sol, no quarto iluminado não se ouviu mais piu, nem mais bom-dia. Onde foi o passarinho que até pouco se vestia? Já com óculos, barba e garantias saindo do banheiro para ganhar a vida não mais encontrou a menina. Desesperado, procurou até no armário, por onde foi essa menina? Correu para a janela - só da janela podia - e avistando uma revoada estava lá seu amor que partia. Tentando voar caiu no jardim, e correndo como um louco foi gritando: volta pra mim? Tarde demais. Pobre passarinho. Se confundia com os homens do caminho. Chamou um táxi. Mandou seguir aquelas coisas que cantavam. Ainda no trânsito, engarrafamento, ligou para a secretária se desculpando do atraso: Era só o que me faltava, uma relação sem salário. O táxi chegando até onde podia, despediu-se dele que correu como pôde até um morro onde poderia dizer a última mensagem. Uma mensagem de amor para a menina querida. Aqueles lindos pássaros, livres, belos ao vento, fez sentir um certo aperto, um determinado sentimento. Puxou do paletó uma arma e mirou numa ave bem bonita. Aquela era tão bela: Servirão as penas e a carne seria frita. Atirou com maestria. Como nunca se atirou em lugar algum. Matou a pobre vítima com astúcia e valentia. Correndo para ver seu presente fez tudo como planejava. A carne virou um prato, e as penas uma mortalha. Ainda hoje, no carnaval, o rapaz se veste de pássaro sonhando voar como um canário. Assim termina a história que um dia se fez nossa pobre família. Entrou pelo bico, saiu pelo papo, quem quiser outra que conte ao contrário.


*texto dedicado a minha atriz mais bela. Sempre me levas aos mais belos caminhos: "Como Almodóvar". Comi.

2 comentários:

Sócrates Santana disse...

Um bonito e singelo texto. Subordinação...
ele não tem a maestria dos últimos. Fale de outras belezas. Encanta, subordinação, pela pureza dos termos e pela eventual rima das frases. Textos assim são leves e gostosos. Atraem o leitor. Só que passam. São raros os textos deste cárater que ficam, emperram, travam, assentam na memória. Não foi o caso, mas, não deixou de ser belo.

Anônimo disse...

Na verdade, gostaria sócrates, que o senhor fizesse uma releitura do texto. Facilmente é percebido preguiça na leitura publicada até então.

isma.