segunda-feira, 10 de março de 2008

Escritos sobre a greve - 13º PARTE

Sócrates Santana

Depois de tossir com a poeira levantada pelo giz, dobrar a rua das flores que não morrem e contornar numa guinada a avenida jornalista beltrano sobrinho e terceiro, finalmente, o menino chega. Não importa aonde, quando se chega, o sentimento é de alívio, as pernas logo de afrouxam e o restante do corpo desaba, como se uma cama branca e macia estivesse abaixo das preocupações de outrora, caindo-lhe uma carta sobre o umbigo, após deitar-se numa sensação virtual de tranqüilidade. Mal fechou os olhos, coube-lhe abri-los novamente, bem verdade, o corpo já revigorado pelo universo de pensamentos que permearam seu andarilho percurso, tendo-o pela frente um envelope incólume. O céu retorna à escuridão, as páginas são pretas novamente, e tensão e angústia voltam à cena, preenchem o enredo e olham para o inconsolável semblante do menino de braços amadurecidos e rosto levemente áspero pelos pêlos que cresceram como grama rasteira no terreno baldio ao lado de casa, que aterrorizado pelo comunicado contido na carta, que dizia, o indicado militante foi convocado para um interrogatório, um depoimento, como queria chamar, a ser prestado no primeiro quartel civil dos sargentos rebeldes e grevistas de dois mil e um, vinculados ao nonagésimo oitavo batalhão das armas confiscadas pela rede mundial de narcotraficantes amigos dos amigos dos homens de lá, na estrada das velhas histórias sobre a ditadura militarizada, número exilado Santiago, Chile, foi pego em desespero e arremessado para um túnel escuro e infinito. Abruptamente o cenário mudou, uma cadeira, porta trancada, recortes de revistas, jornais e panfletos nas paredes, além de imagens multimídias que projetavam cenas históricas de grandes greves realizadas no ABCDário das cidades centrais dos proletários, um grupo de homens e mulheres vestidos com macacões e munidos de ferramentas, apontados como os principais idealistas da primeira greve geral. A porta, trac, trac, abre-se com dificuldade, ouve-se murmúrios e um refletor ilumina o livro seguro pela mão esquerda do menino. A mesma mão esquerda que arrancou das vísceras de um ancião a verdade inaudita. Uma enxurrada de perguntas veio em seguida e nenhuma resposta. Muita agonia. Pouco oxigênio. Pressão.

Escritos sobre a greve - 11º PARTE
Escritos sobre a greve - 12º PARTE

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